quinta-feira, 22 de julho de 2010

A preservação da identidade afrodescendente

Analisando contextualmente a realidade das comunidades afrodescendentes é por demais evocado o doloroso e longo período de intolerâncias, torturas, perseguições e os elevados níveis de maceração da pessoa humana. Estes atos que nos dias de hoje estão travestidos de um racismo velado continuam a macerar estas comunidades e tomam formas brutalmente discriminatórias ferindo a diversidade e o multi-culturalismo existente em nossa nação.
O Brasil possui a maior população negra fora da África e a segunda maior do mundo atrás apenas da Nigéria. Causa espanto que passados 122 anos da Abolição da Escravatura, os negros continuem seu martírio à margem da sociedade, um martírio que dentre muitos fatores se acentua nos dias de hoje personificado em um completo desrespeito ao seu direito à liberdade de consciência de crença e a dignidade dos cultos e religiões de matriz africana praticadas em território brasileiro.
A constituição de uma sociedade é complexa e múltipla, nela está toda uma gama de culturas e de grupos sociais que inflam a necessidade da garantia à pertença cultural e à diversidade. Na gênese das sociedades está também o conceito da universalização dos direitos dos cidadãos que romanticamente concebe a idéia de unidade legal entre todos. Entretanto, este conceito de universalização dos direitos do cidadão é falho no que diz respeito à percepção das diferenças, contextualmente este conceito esta longe de fazer o devido reconhecimento das diversidades multi-culturais e multi-étnicas, sendo assim, passa por acentuar ou perpetuar a marginalização de grupos como os de origem africana.
A colonização impetrou os padrões humanos e culturais desejáveis para a colônia que nascia

Ao longo da história vem se constituindo uma vasta literatura sobre afro-descendência, bem como sobre os movimentos de resistência das culturas africanas que migraram para o Brasil. Alguns trabalhos ressaltam a questão do impacto causado pela presença do colonizador que, inicialmente, tentava impor suas tradições através de uma ideologia baseada na incorporação de seus valores e na conseqüente submissão do negro. Evidentemente, houve um fracasso do ideal de branqueamento físico, mas a ideologia proveniente desse processo histórico foi mantida no imaginário coletivo brasileiro, tanto daqueles considerados negros quanto dos brancos e mestiços, de maneira que todos compartilham dos mesmos estereótipos; prejudicando o ideal dos movimentos sociais na busca pela produção crítica de uma identidade afro-descendente[1]. Essa ideologia é disfarçada por mecanismos “... subliminares de encobertamento permeados por um aparente tratamento cordial” [2], uma farsa sobre o preconceito, o que o torna mais difícil ainda de ser localizado e compreendido. Porém, em contraponto a qualquer tipo de cristalização e inércia das forças ideológicas e das tradições, esses movimentos sobrevivem, na tentativa de produzir uma identidade individual e coletiva através da reconstrução da própria história, origens e peculiaridades de cada grupo. E para uma percepção mais apurada desse processo, faz-se necessária uma reconstrução histórica. Em torno do século XVI, iniciaram-se as grandes navegações, que proporcionaram ao homem europeu um impacto no contato com tanta diversidade. Diante desta nova realidade, houve um conseqüente espanto, pois as novas concepções de realidade oferecidas demandavam uma reconstrução de valores. As tradições já não eram suficientes para ordenar e oferecer segurança e o pensamento moderno não era capaz de suportar tanta ambivalência[3]. A colonização brasileira foi marcada pelo pensamento moderno, imbuído por concepções “enraizadas na busca da ordem e na eliminação da ambivalência” [4]. Foram utilizadas estratégias violentas e excludentes, visando o controle e constituição de um padrão humano e de uma cultura consideradamente desejáveis.


Texto: Alisson Ferreira
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[1]MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus identidade negra. Belo Horizonte: Autêntica. 2004.
[2]FERREIRA, R. C. O brasileiro, o racismo silencioso e a emancipação do afro-descendente. Psicologia & Sociedade. 2002
[3]IDEM, FERREIA (2002)
[4]IBIDEM, FERREIRA (2002)

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